terça-feira, 5 de janeiro de 2016

A Emparedada da Rua Nova

Este é um dos livros que estava na minha meta do ano passado e eu acabei terminando este ano. Como eu já disse, acabei não lendo metade do que eu gostaria em 2015; mas, então, acabei colocando os livros inacabados todos para as metas deste ano. E seguimos em frente.

A Emparedada da Rua Nova é um romance de Carneiro Vilela - escritor pernambucano e fundador da Academia Pernambucana de Letras - ambientado no Recife de 1864 e foi há uns dois anos usado como base de uma minissérie da Globo chamada "Amores Roubados". Não cheguei a assistir à série, porque nem sempre tenho muita paciência para acompanhar programas na televisão, mas ouvi falar muito bem. Inclusive, foi lendo uma resenha sobre ela que me despertou a vontade de ler o livro. Diferentemente do livro, a série se passa nos dias atuais, no sertão do Nordeste. Depois de ter acabado de ler, eu fiquei bem curiosa sobre como conseguiram adaptar para o presente as questões mais temporais da história. Qualquer dia, pretendo procurar e assistir de uma vez só.

Mas voltando ao livro: Trata-se de uma trama meio mórbida, mas extremamente bem escrita, em que Carneiro Vilela (dei muito mais valor por ser meu conterrâneo e nós, recifenses, somos extremamente bairristas) conversa a hora toda com o leitor, confessando ter pego algumas lendas urbanas locais, alguns costumes esquisitos, um pouco de sarcasmo, adicionou uma história metade verídica, metade vinda de boatos, e construiu seu romance assim, como uma colcha de retalhos, sem respeitar nenhuma ordem cronológica. A história começa com o caso quase todo resolvido: com a manchete no Diário de Pernambuco sobre a descoberta do cadáver de um homem num engenho, no município de Jaboatão. Seguem-se acontecimentos que tiveram parte um pouco antes desse fato; depois a história vai voltando e sendo contada de trás para frente. Começam a se apresentar personagens e, só depois, acabamos sabendo quem é o tal cadáver e como se deu a morte dele. Depois disso, desenrola-se um epílogo e só nas últimas páginas dessa última parte é que se acaba deixando tudo claro.

Com o evidente objetivo de fazer uma grande crítica, ou várias, à sociedade falsa moralista da época, os personagens são todos construídos com grandes falhas de caráter e com muito apego pelas aparências e pelo dinheiro. OK, até aí, nada de novo; nessas horas é que se percebe o quão pouco evoluímos nesse aspecto. Mas havia coisas bem específicas, como a educação religiosa das mulheres em colégios católicos e na opinião do autor sobre a pouca ou nenhuma condição desses colégios em educar propriamente essas mulheres, questão bastante frisada no livro. Para não falar muito mais, o livro pintou um quadro sobre o Recife no século XIX, suas paisagens, suas festas, seus costumes: a parte mais bela nessa história tão macabra.

É preciso dizer que houve uma coisa que me irritou muito: a maneira como o autor lida com as reações das mulheres às situações traumáticas. Eu não vivi em 1864, mas, por favor, que bando de mulher mole pra desmaiar por nada era aquela? Fora a outra, que levou um susto e acabou tendo febre e delirando durante uns três dias. Será que a síndrome vasovagal, presente na minha família, está assim tão presente nos genes das famílias recifenses, ao ponto de virar história? Ou é somente Carneiro Vilela sendo sarcástico sobre a fragilidade das mulheres superprotegidas da alta sociedade? Porque as caboclas e as escravas, nenhuma delas sofreu nada parecido.

Dito isso, só preciso dizer que é um livro excelente, principalmente para quem está procurando bons livros de literatura brasileira, literatura recifense, com temas locais. Para aqueles que nunca dão chance aos autores brasileiros, só posso dizer que estão perdendo de admirar a língua portuguesa brasileira em sua plena majestade, com suas belas expressões regionais e sem passar por traduções. Sério, é de chorar de orgulho. Ou talvez eu seja somente uma recifense muito bairrista.


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Resenha para o Desafio Literário de 2016, com o tema: "de autor brasileiro". Para saber mais sobre o Desafio, clique aqui e participe.

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